segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A criança e a mídia - futuros problemas de saúde...

Fonte: http://www.abeso.org.br/pagina/329/a-crianca-e-a-midia.shtml

  
Ana Gabriela Cepeda Gouveia; Sofia Sayuri Yoneta - Acadêmicas de Nutrição da Liga de Obesidade Infantil do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Dr. Marcio Mancini - Chefe da Liga de Obesidade Infantil do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Todos os dias somos bombardeados por mensagens de diversos veículos da mídia, as quais procuram seduzir novos consumidores, exigindo constantemente nosso senso crítico para a tomada de decisões. Na infância essa ferramenta não está completamente madura, tornando as crianças mais vulneráveis a tais apelos comerciais. Apesar dessas considerações, as crianças são abordadas como consumidores ativos, com publicidade voltada diretamente para esse público, pois a sua capacidade de influenciar o núcleo familiar é muito grande.
De acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2008-091, 34,8% dos meninos e 32% das meninas de 5 a 9 anos têm excesso de peso, e 16,6% e 11,8%, respectivamente, são obesas. Vários fatores podem estar na gênese da obesidade, no entanto mudanças no estilo de vida e nos padrões alimentares poderiam explicar esse crescente aumento de obesidade nos últimos anos - como a redução da atividade física, o consumo de alimentos muito calóricos e de baixo valor nutricional, e a exposição excessiva da criança à mídia.
As primeiras experiências são fundamentais na formação de preferências alimentares individuais, uma vez que os seres humanos possuem uma predileção inata pelo sabor doce, alimentos ricos em gordura e alimentos salgados, além de uma relutância em experimentar alimentos desconhecidos. Desse modo, as crianças aprendem sobre os alimentos que gostam ou não por meio da variedade de alimentos à qual elas são expostas, observando e vivenciando as consequências e vantagens de consumí-los.
Porém, atualmente as mensagens comerciais estão formando a memória em relação aos alimentos mais do que a própria experiência de prová-los. Os produtos alimentares ocupam a maior parte do tempo dedicado à publicidade na televisão, em canais que a maioria das crianças assiste, e aproximadamente 60% dos alimentos anunciados são de baixo valor nutritivo2. Tais alimentos estão associados muitas vezes a brindes, jogos e embalagens atrativas que instigam o consumo, mesmo sem apetite, e podem representar para a criança uma forma de recompensa por ter consumido aquele produto - mesmo que esse não traga nenhum benefício para sua saúde. Esse assédio consumista desenvolve um constante sentimento de insatisfação, além de constituir duas faces da mesma moeda: a publicidade que ajuda as crianças a engordar é a mesma que apresenta a magreza como padrão de beleza.
O Brasil passou os Estados Unidos e hoje é o país em que a criança mais assiste à televisão(uma média de 4h51min19seg por dia em 2005)4. É assustadora a força, para o bem ou para o mal, que esse meio de comunicação social de massa possui perante o referido público telespectador. Dados revelam que bastam 30 segundos para as crianças serem persuadidas por um comercial de alimentos5.
A inconsequência do marketing infantil acaba por transformá-las (aproveitando-se das fantasias infantis) em promotoras de vendas junto aos pais, fazendo com que elas desejem com tanta intensidade que acabam convencendo os pais da necessidade daquele produto. Deste modo, no desejo dos pais de verem os filhos felizes, as relações afetivas passam a ser mediadas pelas relações de consumo6 e as crianças passam a valorizar o que tem materialmente, e não mais o que são de fato. Além disso, desenhos animados, heróis e figuras famosas são constantemente utilizados para aproximar as crianças do produto e fazem com que elas se identifiquem com o que é anunciado. Isso prejudica a educação das crianças e confunde os valores afetivos e nutritivos.
Muitos pais não percebem esse fato, mas o marketing não só sabe muito bem disso, como busca, continuamente, formas de se aproveitar dessa vulnerabilidade da criança em benefício da venda, sem preocupações com as consequências desastrosas que os maus hábitos obtidos na infância podem ocasionar no futuro. A busca somente pelo lucro sobrepõe-se à intenção de oferecer um produto que beneficie verdadeiramente os consumidores.
A responsabilidade da influência da mídia no aumento da obesidade infantil seria da indústria de alimentos, pelo abuso publicitário de mercadorias focadas no público mirim? Ou seria dos pais, por não controlarem adequadamente o acesso das crianças à TV e aos alimentos?7
O estudo realizado por Harris e Bargh (2009)8 confrontou a comunicação e regras familiares com o hábito das crianças assistirem televisão, analisando suas respectivas forças em determinar, durante a infância, hábitos e preferências alimentares futuros. Verificou-se que a escolha de alimentos com poucos nutrientes e alta densidade calórica é estimulada pelo hábito de assistir televisão, visto que até mesmo a percepção de sabor dos alimentos pode ser alterada: são considerados mais saborosos aqueles anunciados do que os não comunicados. Além disso, viu-se que apenas o conhecimento nutricional não é suficiente para determinar o consumo de alimentos saudáveis.
Esse estudo também constata que os pais podem mediar positivamente a relação entre os gostos alimentares das crianças e a mídia à qual elas são expostas, estimulando a visão crítica de seus filhos dentro da comunicação familiar. Essa estratégia se mostrou mais eficiente. Imposição de regras, como limitar o tempo em frente à televisão, reduz a exposição da criança à publicidade, porém não necessariamente diminui sua predileção por alimentos de baixo valor nutricional anunciados na televisão. Isso porque não dialogam com a criança sobre os motivos das restrições a que é sujeita. Nenhuma estratégia, contudo, é suficiente para evitar a influência da mídia, o que reforça a necessidade de a publicidade ser propriamente regulamentada e assegurada.
As crianças são dependentes e cabe aos pais despertar o senso crítico delas para defendê-las dos apelos da publicidade. No entanto, os pais também são assediados pela mídia, que banaliza o consumismo e deixa perceber pouco os danos causados, exigindo, portanto, um passo anterior de  conscientização dos próprios adultos.
Os pais devem ser orientados acerca da importância de opor-se à publicidade voltada às crianças, devem ser incentivados a participar da vida dos filhos e a desenvolver o senso crítico juntos. No combate à obesidade, esta estratégia de enfrentar os abusos da mídia deve avançar dentro dos tratamentos clínicos e em conjunto com as famílias, bem como na política pública, respaldados pelas leis em defesa da criança e do adolescente.
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Oferecemos arquivo de textos específicos, de documentos, leis, informativos, notícias, cursos de nossa região (Americana), além de publicarmos entrevistas feitas para sensibilizar e divulgar suas ações eficientes em sua realidade. Também disponibilizamos os textos pesquisados para informar/prevenir sobre crescente qualidade de vida. Buscamos evidenciar assim pessoas que podem ser eficientes, mesmo que diferentes ou com algum tipo de mobilidade reduzida e/ou deficiência, procurando informar cada vez mais todos para incluírem todos.