O livro que leva este título acaba de ser lançado, mas já tem uma
longa história: começou a ser pensado em Guapimirim /2005, em uma
reunião de profissionais que queriam refletir sobre suas experiências,
ao enfrentar o processo de envelhecer. O debate se estendeu desde então,
entre reuniões e conversas (in)formais e finalmente se concretizou
nesta coletânea, da qual muitos participaram. Para apreender a
complexidade da temática, esta foi abordada desde diversas dimensões.
Na dimensão social, Lucia Ribeir aponta transformações que
possibilitam aos idosos uma melhor qualidade de vida, apesar do
persistente preconceito; na físico-biológica, Maria José dos Santos
indica mudanças sempre permeadas pela subjetividade; já no aspecto
psicoanalítico,Fernando Rocha mostra a coexistência de reações de medo e
de tristeza pelas perdas, com o surgimento de elaborações criativas; e,
finalmente, Leonardo Boff, na dimensão filosófico-espiritual, enfatiza o
polo da interioridade, com sua possibilidade de crescimento indefinido,
vendo a morte como a passagem para uma vida plena.
Ao lado destes textos mais analíticos, o livro inclui também alguns
testemunhos preciosos de pessoas que conhecem a velhice por dentro, como
Marialzira Perestrello, Luis Viegas, Rose Marie Muraro e Yolanda
Bettencourt e também de uma criança, Francisco Oromi R. de Souza, vendo a
velhice de longe. Finalmente, o livro conta ainda com a dimensão
poética, com dois belos sonetos de Rogério Luz.
Ao analisar a situação social do idoso, incluímos a experiência de um
setor específico – profissionais urbanos de classe média – pertencente à
geração que nasceu nas décadas de 30 / 40. Isto nos possibilitou
aprofundar a reflexão a partir de uma prática concreta e desde uma
perspectiva que encara o processo do envelhecer de forma dialética: sem
negar as perdas e as limitações reais, que não podem ser maquiadas,
descobre também os espaços positivos que se abrem nesta fase.
A partir desta perspectiva, que assume perdas e ganhos, foram
identificados alguns desafios, que se colocam no mundo atual para a
nossa geração:
- Conseguir aceitar subjetivamente a metamorfose que objetivamente
está se dando em nós (e que, frequentemente, é mais visível para os
outros do que para nós mesmos!), reconhecendo a necessidade do cuidado,
sem esquecer a conquista permanente da autonomia possível;
- Saber dialogar com as gerações mais jovens, abertos às suas
perspectivas e descobertas, mas sem abrir mão de uma visão crítica;
- Assumir um compromisso ativo e participante em grupos, sejam eles
profissionais, religiosos, culturais ou de qualquer outro tipo, e
sentir-se parte de um todo, assumindo sua responsabilidade pessoal, a
partir de nossas possibilidades atuais;
- Não abrir mão da criatividade, para inventar novas formas de viver a
sexualidade, baseada na libido e no afeto e no que cada um julga mais
adequado às suas próprias condições;
- Descobrir a riqueza de construir a solidão, como um momento de encontro consigo mesmo;
- Reconciliar-se com o passado, com suas realizações e, sobretudo,
com suas omissões e falhas — hoje já irrecuperáveis — e descobrir a
função social do resgate da memória, com a lucidez de distinguir o que
ainda pode ser enriquecedor, no momento atual, do que precisa ser
definitivamente superado;
- Tomar consciência de nossa finitude, embora o tempo que nos resta
seja imprevisível: só quando integramos e aceitamos a morte podemos
viver plenamente a vida;
- Aprofundar a vida interior e a espiritualidade – própria de
qualquer ser humano, independente de ter ou não uma opção religiosa –
questionando o sentido da vida e reconhecendo nela a dimensão do
Mistério.
Estes e outros desafios permeiam a travessia das águas ora serenas
ora turbulentas — mas sempre instigantes — da sexta à nona década da
vida.
Nossa geração viveu tempos marcados pela esperança de transformar o
mundo, expressa em processos políticos, culturais, sociais. Viveu também
os momentos de ocaso, de revezes, de desilusão.
Mas para muitos de nós, que participamos ativamente destes processos,
o compromisso com a transformação social, em seus mais diversos níveis,
continua vivo. E no atual momento da vida, acreditamos que “um outro
envelhecer é possível”, se nos assumimos como sujeitos ativos desta
etapa, tornando-a uma experiência socialmente fecunda e pessoalmente
feliz.
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