Por Naziberto Lopes
Destaco a seguir aos meus comentários o artigo de hoje do jornalista Jairo Marques, “Quinze Dias no Mundo Ideal”, que fala dos 15 dias que passou em Londres, durante a disputa das Paralimpíadas. Faço esse destaque para discordar frontalmente do autor, para dizer que a sociedade que ele vislumbrou é algo artificial, produzida somente para aquele momento, durante aquele evento, para durar 15 dias e não para se perpetuar, como deveria ser a coisa certa.
Desde o início de minha militancia e ativismo social e político nas causas dos direitos das pessoas com deficiência eu defendo que as Olimpíadas devem ser uma única coisa, que os jogos devem ser realizados no mesmo momento, todos os atletas juntos e que a delegação brasileira deve ser uma só, bem como a dos outros países, afinal, são atletas com uma única bandeira, língua, cultura, nacionalidade.
Claro que o feito dos atletas com deficiência deve ser ressaltado, assim como o desempenho de todos os outros atletas, tenham ganhado mais ou menos medalhas, afinal, as comparações nesse sentido não podem e nem devem ser feitas, pois cada qual é mestre dentro de suas limitações e categorias nas quais competem.
Todavia, a separação, a segregação dos atletas com deficiência em momentos separados, dias e dias após o encerramento das Olimpíadas convencionais, no meu entendimento é defender aquilo que tanto combatemos, ou seja, enquadrar as pessoas dentro de suas caixas, de seus guetos, de suas áreas pré determinadas em função de não poderem participar da sociedade como um todo.
Dizer que 15 dias após os jogos convencionais a cidade de Londres ficou recheada de pessoas com deficiência é o mesmo que dizer que abriram-se as portas dos asilos, das prisões e dos conventos e deixaram a galera diferente sair às ruas, andar pelas calçadas e participarem, agora sim, da festa, depois que ela já foi realizada e que os faxineiros já limparam a bagunça deixada pela galera da festa principal.
Por que não toda galera participando da festa juntos? Por que não uma única festa para a comemoração de uma única coisa, ou seja, a celebração de um grande encontro esportivo entre Nações do mundo inteiro que disputarão jogos de diversas modalidades? Por que não uma única torcida, uma única arquibancada repleta de torcedores que gostam do esporte praticado como ele tiver que ser praticado, com próteses de titânio ou com pernas de carne e osso, com cadeiras de rodas ou com tênis tecnologicamente construídos para aquilo?
E o pior de tudo é saber que são as próprias pessoas com deficiência que defendem a existência dos jogos olímpicos separados, apartados, os normais de um lado e os não normais do outro. E depois disso, depois que o mundo inteiro, que assiste às olimpíadas convencionais, discrimina e coloca em caixas, em guetos e em sociedades paralelas as pessoas com deficiência, reclamamos, questionamos os porquês, buscamos as explicações.
Quem televisionou as olimpíadas paralelas das pessoas com deficiência no Brasil? Quem transmitiu ao vivo? Quem fez jornais e matérias especiais para destacar as conquistas ali alcançadas? Bom, em rede aberta ninguém, nem mesmo a Rede Record, com aquela hipocrisia toda de programas voltados para pessoas com deficiência, o tal do ressoar, se dignou a dar uma manchete que seja sobre o assunto.
Somente quem tinha televisão a cabo teve condições de assistir o canal Sport TV transmitir alguns jogos. Mas é uma televisão paga, restrita, somente para poucos.
Claro que essa minha crítica não vai somente sobre o Brasil, pois se as olimpíadas paralelas para as pessoas com deficiência são feitas da forma que são é porque existe um acordo internacional de segregação, de separação, de divisão social entre os atletas normais e os atletas não normais. Por isso a crítica vai para os organizadores como um todo, que propagandeiam, a cada quatro anos, em rede mundial e para todo mundo ver, que a sociedade ideal, na verdade, é a sociedade onde as pessoas normais disputam jogos em um momento e as pessoas com deficiência chegam depois, dias depois, para disputar os mesmos jogos.
Essa é a pior propaganda de segregação, divisão social, apartheid que eu vejo escancarada de quatro em quatro anos, desde que os jogos paralelos para pessoas com deficiência foram criados, e o pior é que eu não vejo ninguém mais defender a união e o fim dessa segregação.
É a minha opinião. E parabéns aos atletas com deficiência, ressalvado tudo acima, que para mim são atletas que não merecem chegar e sair depois, e sim, chegar e sair junto com todos os outros. Qualquer coisa diferente disso é discriminação e aqui no caso, auto segregação.
Fiquem com a matéria de Jairo Marques da Folha de São Paulo de hoje…
Quinze dias no mundo ideal
Naziberto Lopes
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Fonte: Grupo de Discussão MVI Brasil e Folha de São Paulo
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