Jean Carlos adora piadas. Assim que conhece uma nova, sai correndo para contar. No bairro em que mora, tem amigos de todas as idades possíveis. Jean tem dezessete anos, é muito bom aluno, já acabou o ensino médio, e tem hemiparesia na sua mão direita. Isso quer dizer que em seu caso alguma coisa aconteceu em seu pequeno cérebro, ainda nenê-na-barriga da mãe. Fato percebido pelos pais quando tinha um ano de idade.
O bracinho direito ficava encolhido, sem movimentação independente e um terrorista da área de saúde afirmou que ele nunca iria andar ou falar. Ele joga vôlei e basquete, “não é tão bom quanto os outros”, mas alguém é bom em tudo? Este resultado só foi possível por orientação correta de médico do Hospital das Clínicas - que indicou a máxima e mais intensa estimulação possível, desde muito cedo, para minimizar a perda neurológica do acidente vascular cerebral intra-uterino, que reduziu força e controle muscular na mão direita e criou leve perda de desempenho na perna do mesmo lado. Foram quase dez anos de APAE, com fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e tudo o que foi possível, até atendimento em clínica particular.
Para dar conta de todo este importante trabalho, com locomoções, horários e exercícios sua mãe Elizabeth convenceu o marido José Maria a ser pai de um único e bem cuidado filho. Nas voltas que a vida dá, o trabalho desta mãe inclui atender, na casa em que trabalha, a adulto que sofreu AVC e necessita de alguma supervisão, há doze anos. A escolaridade no início deu um pouco de trabalho, era hiperativo, mas com troca de professora e classe se achou e nunca mais perdeu o rumo. Já quer trabalhar. Sonha com faculdade, quer fazer psicologia, acha que sabe escutar e quer ajudar outras pessoas a resolverem seus problemas.
Afirma que nunca se achou deficiente. Jean, em seus poucos anos já acumulou algumas sabedorias – apesar dos seus dezessetes anos, já entendeu que todos vamos ficando menos eficientes e mais deficientes conforme vamos vivendo, e que nascer com um pedaço do corpo que funciona menos não diminui a sensibilidade, a inteligência e a criatividade para conviver e se adaptar. A vida vale mais do que uma deficiência, é maior.
Jean usa o humor sabiamente também – humor desconhece idade, classe social, sexo – busca a inteligência, a quebra de regras estabelecidas, a oportuna rebeldia, é uma forma de contato democrática e acessível, que nivela as pessoas. Reorganiza o fluxo das relações. Ele usa sempre, com todos, com olhar esperto. Cedo ele aprendeu que “Todos vivemos sob o mesmo céu, mas ninguém tem o mesmo horizonte” – Konrad Adenauer.
Caso e nomes reais. Elizabeth Fritzsons da Silva, psicóloga e diretora da Unidade de Atenção aos Direitos da Pessoa com Deficiência, Promoção Social
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