Érica Fraga
De São Paulo
Paulo Muzzolon
Editor-Adjunto de “Mercado”
"Sempre fui dinâmica, independente. Agora, não consigo trabalhar."
Desde que sofreu um acidente com moto, há um ano, Carlita Tarsiana Carvalho, 28, está afastada pelo INSS. Ela torce para recuperar os movimentos do braço esquerdo, hoje totalmente paralisado.
"Já passei por cirurgia, mas não obtive resultado algum", diz ela, que trabalhava em um supermercado, repondo mercadorias nas prateleiras.
A história de Carlita representa uma situação cada vez mais comum. Casos de invalidez permanente entre vítimas de acidentes de trânsito se multiplicaram por quase cinco entre 2005 e 2010, passando de 31 mil para 152 mil por ano.
Nos primeiros nove meses de 2011, houve novo aumento de 52%, para 166 mil, segundo números do Dpvat, seguro obrigatório pago por proprietários de automóveis.
Os dados revelam que a maioria dos acidentados - mais de 70% dos casos em 2011 - usava moto e está em plena idade economicamente ativa (entre 18 e 44 anos).
O quadro preocupa a Previdência Social, que teme ter de arcar com os custos de uma geração de jovens aposentados por invalidez.
"O que mais tem crescido é a concessão de aposentadoria por invalidez devido a acidentes com motos", diz Leonardo Rolim, secretário de Políticas de Previdência.
"Há trabalhadores que só contribuíram [à Previdência] por cinco anos, mas que vão receber aposentadoria por invalidez pelo resto da vida."
Projeções apontam que o INSS gastou R$ 8,6 bilhões com benefícios gerados por acidentes de trânsito. A cifra representa 3,1% de todas as despesas previdenciárias.
PREJUÍZO ECONÔMICO
O DPVAT classifica os casos de invalidez como leves, moderados e graves.
O INSS considera que há situações em que, depois de um período de tratamento, o beneficiário pode voltar a trabalhar, ainda que em outra função. Mas, segundo especialistas, crescem os casos em que o trabalhador acaba tendo de se aposentar.
Antônio Carlos de Souza, 49, acha que dificilmente voltará a ser motorista: "Não consigo subir escada ou dirigir, e já estou afastado há mais de três anos".
Souza dirigia o carro da empresa onde trabalha numa tarde de dezembro de 2008 quando uma Kombi o atingiu. Após o acidente em estrada entre Jundiaí e Campinas (SP), ficou com uma perna mais curta do que a outra.
Segundo Ricardo Xavier, diretor-presidente da Seguradora Líder, que administra o DPVAT, o forte aumento da frota de carros e principalmente de motos nos últimos anos explica a explosão dos casos de invalidez.
"Qualquer acidente de moto pode gerar invalidez porque o motorista é mais vulnerável", afirma Xavier.
De 2001 a 2011, as vendas de motos quase triplicaram, chegando a 1,94 milhão no ano passado. Em 2011, as vendas de carros atingiram 2,65 milhões de unidades, pouco mais que o dobro das de 2001.
O engenheiro e sociólogo Eduardo Vasconcellos diz que a explosão dos casos de invalidez gerados por acidentes com moto representa um prejuízo para os acidentados e para a economia do país.
Ele diz que o cenário de acidentes com motos tende a piorar ainda mais nos próximos anos. "Existe um grande desafio que é o que fazer com as motocicletas."
A preocupação com o problema levou a Previdência a reivindicar participação no Contran (Conselho Nacional de Trânsito) para participar da discussão e da elaboração das políticas de trânsito.
INSS reconhece que há pouca reabilitação
De São Paulo
Gastos com benefícios devidos a acidentes de trânsito tendem a aumentar devido à falta de programas de reabilitação.
O problema é a escassez de estrutura e de peritos do INSS, diz o advogado Theodoro Vicente Agostinho, sócio do Raeffray Brugioni Advogados e integrante da Comissão de Seguridade Social da OAB-SP.
"A reabilitação existe na lei. Na prática, vemos muito pouco isso", afirma.
Essa escassez impede o censo da invalidez -convocação dos aposentados por invalidez, prevista em lei, para nova perícia que avalie se têm condições de retornar ao trabalho.
"Se for constatado que o retorno ao trabalho é possível, o benefício pode ser cancelado", diz.
O secretário de Políticas de Previdência Social, Leonardo Rolim, reconhece que a reabilitação está defasada, mas afirma que o INSS está estudando a reestruturação do sistema.
Segundo ele, há um projeto-piloto em São João da Boa Vista (SP), em parceria com o Senai, que vem apresentando bons resultados. "O INSS paga próteses, quando necessário, e a reabilitação é feita pelo Senai", diz. A expectativa é levar esse sistema de parcerias para todo o país.
"A reabilitação tem ser rápida, para que o trabalhador possa retornar o mais rápido possível ao mercado", afirma Rolim.
O segundo passo é a realização do censo. Hoje, cerca de 3 milhões de beneficiários recebem a aposentadoria por invalidez.
Em tese, todos deveriam passar por uma nova perícia médica. (PM)
Fonte: Folha de São Paulo, 17 de Janeiro de 2012
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