sexta-feira, 18 de maio de 2012

MUDANÇAS JÁ!: Pessoa com deficiencia auditiva versus a realidade social ainda pouco inclusiva para eles.



Meu nome é Edson. Existem oito surdos em minha família, o que sugere peso genético nesta surdez. Minha mãe conta que quando pequeno eu era muito doente, tinha muita febre e muita dor de ouvido- posso ter comprometimento de tímpano por antigas infecções. Morávamos em sitio, com muitas dificuldades minha mãe era empregada e meu pai sitiante.

Tive sorte de ter próxima de mim escola para surdos – mas eu pegava trem e tinha quatro quilômetros para andar a pé para chegar (quatro para voltar). Comecei com nove anos sozinho, com muito medo de temporais e cachorros bravos. Se eu não quisesse ir apanhava de minha mãe. Freqüentei ate meus 14 anos. Meu pai decidiu que eu devia trabalhar no sítio, ajudando a vender a produção de amendoim, algodão, feijão e ovos. Era complicado vender porque eu não sabia o valor do dinheiro. Meu pai não comprava roupas ou calçados para mim. Então minha mãe achava terrenos para eu carpir e ganhar algum dinheiro.

De tanto apanhar dele com vara de bambu na cabeça (para trabalhar), fiquei tão triste que quase me joguei contra um trem passando. Também quase me joguei em poço de 30 metros de profundidade. Alerto aqui para o fato de que todas as famílias de surdos precisam de apoio técnico, desde o nascimento desta criança e por muitos anos, até a integração social. Com quinze anos fugi de casa. Voltei atendendo pedido de minha mãe. Com dezoito anos fugi de novo para a casa de minha avó, em outra cidade.

Passei fome procurando trabalho em Campinas. Cheguei à escola da Unicamp onde aprendi a língua de sinais (Libras). Hoje sou capaz de leitura labial (graças à primeira escola baseada em oralidade) e uso Libras também. Arrumei namorada (surda). Trabalhei em padaria e depois em grande empresa. Tivemos três filhos de nosso casamento, hoje com 20, 19 e 17 anos, todos ouvintes. Em nossa casa estamos todos empregados. No passado fui vendedor de objetos em semáforos e esquinas, mas a lei de cotas criou oportunidades de trabalho estável para mim.

Quero deixar claro mais uma vez que precisamos criar escolas para surdos, com instrutores surdos e que precisamos integrar essas crianças também com a escola regular buscando “Comunicação Total”. Precisamos usar toda nossa criatividade e as ferramentas possíveis- como leitura labial (oralidade) gestos, expressões fisionômicas, linguagem de sinais (Libras), e dar condições de acesso digital adaptado, além de mecanismo de tradução de Libras disponível via internet 24 horas dia para serviços emergenciais (hospitais, bancos, escolas, delegacias...).Se possível à partir de ontem. “Viver é um descuido prosseguido” - Guimarães Rosa.




Caso real. Elizabeth Fritzsons da Silva, psicóloga e diretora da Unidade de Atenção aos Direitos da Pessoa com Deficiência, colaboradora do “O Liberal”

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