Foram mais de sessenta anos
construindo uma família e minha liberdade.
Sou Domingas, de 70 anos. Eu tinha três anos, minha mãe ficou
tuberculosa. O pai cuidando dela, adoeceu
também. Órfã, fui ficando de casa em casa de parentes por uns tempos, sem um
lar, longe das irmãs, com o mesmo destino. Fazendo o serviço doméstico,
consegui aprender a ler, mas escrevo mal. Aos nove anos, a dona da casa, minha
tia, faleceu subitamente, deixando dois filhos pequenos. Assumi a tarefa da
criação destas crianças e todo o serviço da casa, até meus vinte e quatro anos.
Eu me sentia velha, sem idade para casar. Conheci um moço que morava próximo,
sozinho, baiano, com vinte e oito anos, também se achando velho demais para
casar. “Namoro” de dois meses, fuga para casar. Neste momento, foi a única
saída. Sentia muitas saudades de meus dois filhos “criados” Nosso casamento não
fluía bem, ele era truculento demais, brigávamos. Eu tinha extrema facilidade
para engravidar, chegamos aos cinco filhos, e eu sofria quando ele espancava as
crianças. Pacientemente esperei que cada um construísse seu canto, sua família.
Ele resolveu morar em uma casinha nossa, no interior. Junto conosco morava a
filha mais nova, seu marido, a neta. Perguntou: Eu escolhia o casamento, ou a família?
Respondi que os filhos são a minha vida. Ele se foi, faz oito anos. Nos
primeiros meses eu achava que ia voar, de tão livre que me sentia, uma delícia
completa poder andar pelas ruas, ver vitrines, comer em um restaurante. Faz
seis meses que freqüento todos os dias o CIVI (Clube do vovô). Faço Pilates,
Hidroginástica, Dança Circular, Ginástica na areia. Moro próxima de todos os
filhos. O marido quis “voltar”, várias vezes, eu não.
“A liberdade é a possibilidade do
isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo.” Fernando Pessoa.
Caso real, Elizabeth Fritzsons da Silva, psicóloga, e-mail:
bfritzsons@gmail.com
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