ENTREVISTA - ANDREW COATS
Não existe interesse comercial em provar eficácia de exercícios
Médico inglês critica baixo incentivo à prática de atividade física contra a insuficiência cardíaca
É o que defende o cardiologista inglês Andrew Coats, 56, editor do "International Journal of Cardiology" e professor da Universidade de Warwick (Reino Unido).
Segundo ele, estudos mostram que pacientes cardíacos que fazem atividade física têm melhora do músculo do coração e do nível de cansaço, resultando na redução de mortes e da hospitalização.
Mas, por medo ou desinformação, poucos médicos recomendam a prática de exercícios aos pacientes com insuficiência. Para Coats, como o treinamento físico não envolve interesses comerciais, a aceitação de sua eficácia "se torna muito mais lenta".
A seguir trechos da entrevista que concedeu à Folha durante o congresso brasileiro de insuficiência cardíaca.
Folha - Muitos pacientes com insuficiência cardíaca pensam que o melhor é descansar, não se exercitar. Por quê?
Andrew Coats - Esse pensamento ainda resiste, apesar de haver muitas evidências mostrando o contrário. Um grande estudo realizado na Europa mostrou que os cardiologistas ou não falam ou falam de maneira vaga sobre exercícios físicos e que é pequeno o número de pacientes que os praticam no processo de recuperação.
Por que os médicos resistem tanto em fazer essa recomendação de maneira enfática?
Os médicos têm medo de adotar novos tratamentos até que haja consenso de que eles são eficazes e seguros e que terão seus custos cobertos.
No caso do medicamentos, as empresas pagam pela publicidade e aprovação. Já quando se trata de treinamento físico, não há interesse comercial de ninguém em pagar esses custos. Isso torna a conscientização e a aceitação muito mais lentas.
Como os exercícios melhoram a qualidade de vida desses pacientes?
Estudos mostram que há melhora do músculo cardíaco e do nível de cansaço. A redução da apneia do sono foi outro benefício observado. Há oito anos fizemos uma revisão de estudos envolvendo cerca de mil pacientes. Identificamos melhora na sobrevida absoluta. Outro estudo, com 2.300 pacientes de ambulatório, mostrou tendência de redução da mortalidade e da hospitalização.
Quais exercícios são os mais adequados?
Os aeróbicos, como caminhadas, bicicleta, natação e dança, e o treinamento de força são úteis e eficazes. Não apenas os de fortalecimento músculo-esquelético, mas também músculo-respiratório. O tipo de exercício tem que ser adaptado às necessidades de cada paciente.
Qual o grande desafio ao prescrever atividade física ao paciente com a doença?
A grande dificuldade é estabelecer qual a carga de exercício físico ideal para cada paciente, como protegê-lo de exageros e como manter sua adesão aos exercícios. A falta de acompanhamento do paciente é outro problema.
Como manter a adesão, já que a tendência é as pessoas desistirem dos exercícios?
A falta de disposição do paciente de incorporar a atividade física no dia a dia preocupa. Após seis meses, muitos abandonam a prática. Atividades em grupo podem ajudar na adesão.
É preciso entender os hábitos, o estilo de vida e propor alternativas. Nosso desafio é mostrar que o esforço vale a pena. Só assim vamos conseguir ajudá-los a incorporar isso no dia a dia.
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