SAÚDE » »Demência na velhice afeta sexualidadeTer Alzheimer ou outro tipo de deficit cognitivo não anula a libido do idoso, mas especialistas ponderam que as limitações do paciente e as pressões sobre o parceiro podem dificultar a expressão dos desejos sexuais
Publicação: 30/07/2014 12:39 Atualização: 30/07/2014 12:43
No livro A velhice, publicado em 1970, Simone de Beauvoir é dura com as palavras. “Essa anomalia normal, a velhice, parece ser vivida, no plano da saúde, com uma mistura de indiferença e mal-estar. Conjunturamos a ideia de doença, invocando a idade; aludimos à noção de idade, invocando a doença, e, com esse ardil, conseguimos não acreditar nem em uma nem em outra.” Nessa confusão, aceitar a sexualidade na terceira idade é um desafio, ainda mais complexo quando está associada a problemas de saúde mental.
Da mesma forma que idosos com demência sofrem alterações na cognição, na memória e no julgamento, podem ter a sexualidade comprometida. “A existência da demência não exclui as necessidades e os desejos sexuais. Temos a percepção de que uma limitação física ou cognitiva impossibilita isso. Pelo contrário, dependendo do tipo de demência, pode aumentar o desejo sexual”, explica Valmari Cristina Aranha, psicóloga do Hospital de Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).
Segundo Aranha, entre os principais aspectos a serem considerados, está a condição do cônjuge do paciente com deterioração cognitiva. “Falar em sexualidade é falar da construção dela e de como o casal a formou.” A psicóloga pondera ainda que existe também o comprometimento da intimidade. Dependendo do grau da doença, há, por exemplo, a presença de cuidadores e a realização de mudanças no espaço físico que podem levar à impossibilidade de um momento de troca efetiva.
Nessas condições, há o risco de declínio da relação e de aumento das insatisfações. “Muitos desses problemas não acontecem com casais que não têm a prática sexual ativa ou não tinham. Eles seguem com a vida naturalmente”, pondera. Quando há uma relação satisfatória e que vai sofrer interferência com as alterações cognitivas, os efeitos costumam ser maiores.
O declínio se dá também em função da sobrecarga de cuidados pelo parceiro, principalmente as mulheres, as que mais se responsabilizam pelo companheiro com demência. O cansaço físico acaba desviando o interesse pelo sexo. Outra reação é a mudança de papéis. O idoso com Alzheimer ou outras complicações cognitivas vira um filho para o cônjuge. “São atividades desde cuidar da higiene física até trocar fraldas. Fazer essa configuração para depois existir um desejo sexual é difícil”, observa Aranha.
Normalmente, a insatisfação do parceiro se mostra mais evidente quando há um problema de disfunção erétil ou de falta de confiança. Num cenário em que um dos idosos tem demência, o parceiro saudável pode se questionar se, quando inicia uma interação sexual, está “abusando” do outro e seu desejo sexual condiz com a sua idade, já que esses desejos durante a velhice são um tabu.
Cuidadores
Autor do trabalho A velha sexualidade nos idosos de hoje: quando surge a demência, José Augusto Simões, professor de mestrado em gerontologia da Universidade de Aveiro, em Portugal, observa que, no caso dos cuidadores, a convivência tende a se tornar ainda mais preocupante quanto maior for a tendência deles de ver o paciente não como um adulto dotado de identidade sexual, mas como um ser assexuado. “Assim, enquanto alguns concordam que o doente tem direito à expressão da sexualidade dentro de certos parâmetros, outros podem simplesmente ignorar o assunto ou, pelo menos, até sentir essas manifestações como uma afronta às crenças pessoais e aos códigos morais.”
Para o especialista, os profissionais que lidam diariamente com indivíduos com deficit cognitivo devem estar conscientes de que, à medida que a demência evolui, também as necessidades se modificam. As relações existentes podem sofrer alterações, surgem novos relacionamentos e o desejo sofre flutuações, tudo isso sem alterar o direito que cada adulto tem de permanecer sexualmente ativo. “Desde que assim ele deseje e não violente os direitos do outro, independentemente da idade, da capacidade ou da preferência sexual”, complementa.
Vontade constatada
Estudos realizados na década de 1960 já mensuravam a prevalência dos interesses sexuais na terceira idade. Entre 60 e 65 anos, estão presentes em 60% das mulheres e em 80% dos homens. Nos indivíduos com mais de 70, a porcentagem cai para 26% e 61%, respectivamente. Forma mais comum de demência, o Alzheimer atinge 1% das pessoas que estão na faixa etária de 60 a 65 anos. A partir dessa idade, a incidência praticamente duplica a cada cinco anos.
Da mesma forma que idosos com demência sofrem alterações na cognição, na memória e no julgamento, podem ter a sexualidade comprometida. “A existência da demência não exclui as necessidades e os desejos sexuais. Temos a percepção de que uma limitação física ou cognitiva impossibilita isso. Pelo contrário, dependendo do tipo de demência, pode aumentar o desejo sexual”, explica Valmari Cristina Aranha, psicóloga do Hospital de Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).
Segundo Aranha, entre os principais aspectos a serem considerados, está a condição do cônjuge do paciente com deterioração cognitiva. “Falar em sexualidade é falar da construção dela e de como o casal a formou.” A psicóloga pondera ainda que existe também o comprometimento da intimidade. Dependendo do grau da doença, há, por exemplo, a presença de cuidadores e a realização de mudanças no espaço físico que podem levar à impossibilidade de um momento de troca efetiva.
Nessas condições, há o risco de declínio da relação e de aumento das insatisfações. “Muitos desses problemas não acontecem com casais que não têm a prática sexual ativa ou não tinham. Eles seguem com a vida naturalmente”, pondera. Quando há uma relação satisfatória e que vai sofrer interferência com as alterações cognitivas, os efeitos costumam ser maiores.
O declínio se dá também em função da sobrecarga de cuidados pelo parceiro, principalmente as mulheres, as que mais se responsabilizam pelo companheiro com demência. O cansaço físico acaba desviando o interesse pelo sexo. Outra reação é a mudança de papéis. O idoso com Alzheimer ou outras complicações cognitivas vira um filho para o cônjuge. “São atividades desde cuidar da higiene física até trocar fraldas. Fazer essa configuração para depois existir um desejo sexual é difícil”, observa Aranha.
Normalmente, a insatisfação do parceiro se mostra mais evidente quando há um problema de disfunção erétil ou de falta de confiança. Num cenário em que um dos idosos tem demência, o parceiro saudável pode se questionar se, quando inicia uma interação sexual, está “abusando” do outro e seu desejo sexual condiz com a sua idade, já que esses desejos durante a velhice são um tabu.
Cuidadores
Autor do trabalho A velha sexualidade nos idosos de hoje: quando surge a demência, José Augusto Simões, professor de mestrado em gerontologia da Universidade de Aveiro, em Portugal, observa que, no caso dos cuidadores, a convivência tende a se tornar ainda mais preocupante quanto maior for a tendência deles de ver o paciente não como um adulto dotado de identidade sexual, mas como um ser assexuado. “Assim, enquanto alguns concordam que o doente tem direito à expressão da sexualidade dentro de certos parâmetros, outros podem simplesmente ignorar o assunto ou, pelo menos, até sentir essas manifestações como uma afronta às crenças pessoais e aos códigos morais.”
Para o especialista, os profissionais que lidam diariamente com indivíduos com deficit cognitivo devem estar conscientes de que, à medida que a demência evolui, também as necessidades se modificam. As relações existentes podem sofrer alterações, surgem novos relacionamentos e o desejo sofre flutuações, tudo isso sem alterar o direito que cada adulto tem de permanecer sexualmente ativo. “Desde que assim ele deseje e não violente os direitos do outro, independentemente da idade, da capacidade ou da preferência sexual”, complementa.
Vontade constatada
Estudos realizados na década de 1960 já mensuravam a prevalência dos interesses sexuais na terceira idade. Entre 60 e 65 anos, estão presentes em 60% das mulheres e em 80% dos homens. Nos indivíduos com mais de 70, a porcentagem cai para 26% e 61%, respectivamente. Forma mais comum de demência, o Alzheimer atinge 1% das pessoas que estão na faixa etária de 60 a 65 anos. A partir dessa idade, a incidência praticamente duplica a cada cinco anos.
Difícil com limitações físicas
De acordo com os pesquisadores, estudos anteriores indicaram que a necessidade de intimidade e de expressão sexual são importantes dimensões da qualidade de vida para as pessoas com mal de Parkinson, correlacionando-se com satisfação geral pela vida. “Para as pessoas com essa doença, que têm de lidar com mudanças substanciais na função sexual, alcançar uma relação íntima e sexual satisfatória é um desafio. Esses resultados sugerem que os profissionais de saúde devem se concentrar nas necessidades de parceiros e planejar intervenções específicas que melhorem a condição geral do parceiro”, resume Bronner. (BS)
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eu-estudante/me_gerais/2014/07/30/me_gerais_interna,439893/demencia-
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