Uma análise realizada em uma população tanto rural como urbano, na comarca de General Pueyrredón, diagnosticou que 90% dos participantes do estudo tinham glifosato ou seu metabólito na urina. O estudo foi feito por uma organização ambientalista.
A reportagem é publicada por Página/12, 18-07-2015. A tradução é de André Langer.
Uma pesquisa realizada pela Associação Civil BIOS diagnosticou que 90% das pessoas que participaram do estudo realizado na comarca bonaerense de General Pueyrredó tinham glifosato ou seu metabólito na urina. Participaram do estudo tanto moradores da zona rural como da urbana. Tendo em conta que muitos alimentos industrializados contêm soja, o resultado é preocupante. Também foi demonstrado que os agrotóxicos evaporam e caem com a chuva. E de todos eles, o glifosato foi o herbicida mais encontrado. Em março, a OMS qualificou o glifosato como uma substância “provavelmente cancerígena”. Além disso, pode provocar diabete, Mal de Parkinson e até Alzheimer.
“Fizemos uma análise com amostras de urina de pessoas que vivem no campo ou na cidade, pensando que encontraríamos resultados diferentes. Não foi o que aconteceu: ambas as populações tinham glifosato ou seu metabólito, ou seja, o que se gera no corpo quando o glifosato se metaboliza, no seu corpo”, detalhou Silvana Buján, coordenadora da BIOS, uma ONG que trabalha em colaboração com o Instituto de Análises Fares Taie, que se ocupou da compra dos reagentes para este estudo.
“Do universo analisado, 70% tinha glifosato e 70% AMPA (ácido aminometilfosfônico), o metabólito do glifosato; muitos tinham ambas as substâncias, e apenas uma pessoa não tinha nenhuma. Foi uma revelação para nós. Investigamos e encontramos que a maioria dos alimentos industrializados contém produtos de soja, seja lecitina, farinha ou proteína. Por outro lado, a água e os solos, embora não sejam orvalhados com glifosato, recebem esta substância pelas chuvas”, descreveu Buján.
A análise de urina humana, que denominaram de Fora da Embalagem, é a terceira que a BIOS faz: primeiro fizeram uma análise da água e solo (Operação Espinafre) e depois, em 2013, uma campanha que chamaram de Mau Sangue, na qual buscaram a presença de agrotóxicos no sangue. “O que provamos com essa pesquisa foi que os agrotóxicos não ‘desaparecem’ após sua aplicação. Alguns se degradam em metabólitos que persistem no corpo humano; por exemplo, o DDT não é usado há anos, e, no entanto, temos DDD (seu metabólito) em nosso sangue”, descreveu. E acrescentou que “naquela campanha também encontramos endosulfan, um agrotóxico proibido; isto quer dizer que persiste um mercado negro que o segue comercializando”.
A coordenadora da BIOS assegurou que “o problema é que o nosso corpo recebe centenas de substâncias em diferentes níveis, e moléculas que sozinhas eram relativamente inócuas, mas combinadas, podem ser tóxicas. Por exemplo, em Sierra de los Padres não há grandes plantações e, no entanto, foram encontrados restos de órgãos clorados que simulam ser um hormônio, mas que na verdade desestabilizam o organismo. E não há herbicidas ‘menos danosos’: tudo o que termina com o sufixo ‘cida’, mata. Lamentavelmente, os proprietários de terras, até em períodos de alqueive (quando se deixa de semear em um ou vários ciclos vegetativos) passam glifosato”.
Buján citou um estudo realizado pelo Centro de Pesquisas do Meio Ambiente (CIMA), da Universidade de La Plata, com a assinatura de Lucas Alonso, Alicia Ronco e Damián Marino, no qual se demonstrou que os agrotóxicos também evaporam e depois caem com a chuva. “É como dizer que chove agrotóxicos. O glifosato é um ‘apaixonado evaporador’ e foi encontrado em todas as amostras de água de chuva, que por derivas atmosféricas pode atravessar longas distâncias”.
“Outro estudo anterior à nossa pesquisa foi aquele realizado pela organização espanhola Amigos da Terra em junho de 2013; ali, a análise da urina em laboratório diagnosticou que 45% da população analisada tinha glifosato”, descreveu. A particularidade deste estudo foi que todos os que participaram da amostra moravam em cidades e nenhum teve contato direto com o agrotóxico.
Buján destaca que “é inconcebível que o mundo siga mantendo este modelo de produção de alimentos. Diz-se que sem os agrotóxicos não seria possível manter a produção de alimentos e isso é falso: a maior parte da produção de soja, por exemplo, não é destinada ao consumo humano. É viável mudar o modelo de produção sem agrotóxicos. Há agrônomos que assessoram propriedades que cultivam trigo e pasto orgânicos, com o qual também se obtém carne orgânica. Não é inconcebível querer mudar este modelo; o que é inconcebível é aceitá-lo como está”, concluiu.
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