Gostaríamos de que nossos pais vivessem para sempre.
Só nos conformamos com a morte deles quando precedida de doença incurável que provoque extremo sofrimento físico ou espiritual. Entre essas enfermidades, certamente estão as que comprometem as funções intelectuais. Numa família, nada é mais triste do que ver uma pessoa de idade acabar a vida num canto, dependente dos outros, com o olhar perdido, incapaz de reconhecer as fisionomias mais queridas. Esse estado de alienação, característico das idades mais avançadas, no entanto, costuma levar anos para se instalar.
Os primeiros sinais vêm sob a forma de episódios aparentemente inocentes de falha de memória: o número do telefone da filha, a repetição da mesma pergunta, esquecimento de compromissos marcados, de conversas recentes e do lugar em que os objetos estão guardados. A família interpreta essas manifestações iniciais como sinal de cansaço ou distração inconsequente, próprios da idade.
Evolução da doença
Com o tempo, porém, aumenta a dificuldade para executar tarefas como dirigir automóvel ou encontrar o caminho de casa. A incapacidade de expressar ideias ou sentimentos pessoais e a inabilidade para acompanhar conversações complexas interferem na comunicação e conduzem ao isolamento.
Nos anos que se seguem, o idoso torna-se progressivamente passivo, desconfiado, irritável, insone, muitas vezes agressivo e passa a interpretar mal os estímulos do mundo que o cerca: vê uma cadeira e pensa que é uma mesa, escuta um latido e jura que foi brecada de automóvel. A doença chega à fase terminal depois de um período de dois a dez anos de evolução.
Os últimos estágios são caracterizados pela dificuldade motora, incontinência urinária e fecal, pela perda de apetite, pelo mutismo, por infecções múltiplas e pela morte.
Esse quadro geral descreve as demências, conjunto de doenças que resultam de processos degenerativos, vasculares, infecciosos, tumorais ou metabólicos.
Entre elas, a doença de Alzheimer e a demência vascular – consequentes a múltiplos pequenos derrames cerebrais – são as mais frequentes. Com o envelhecimento progressivo da população, as demências se tornaram enfermidades de alta prevalência. Ao chegar aos 65 anos, de 10% a 15% das pessoas já apresentam sintomas nítidos da doença. Daí em diante, esse número aumenta 3% ao ano, até atingir 40% a 50% dos que completam 85 anos de idade. Como o quadro é insidioso, as famílias demoram a reconhecê-lo; atribuem à rabugice dos mais velhos os problemas vividos por eles. Por fim, quando decidem procurar atendimento médico, encontram profissionais que não foram treinados para prestá-lo.
Possibilidades de tratamento
Atualmente, os especialistas recomendam que, aos primeiros sinais de demência, sejam adotadas medidas para reduzir o estresse psicológico antes da prescrição de medicamentos.
Tem sido demonstrado que a música, especialmente a clássica, diminui a agitação, a ansiedade e a intensidade dos ataques agressivos. Quando combinada à dança ou a exercícios de movimentação, melhora a orientação espacial e a capacidade de auto-expressão.
O exercício físico diário revitaliza as funções intelectuais, dá sensação de bem-estar e ajuda a normalizar os ciclos de sono e vigília. Enquanto houver forças, todas as pessoas de idade devem ser incentivadas a praticar exercícios. Os pacientes que não respondem a essas medidas simples são candidatos ao tratamento farmacológico. Comportamento violento ou agitação permanente pode melhorar com o emprego de drogas antipsicóticas.
A hipersexualidade, que causa tantos constrangimentos aos familiares, costuma responder ao uso de hormônios; a ansiedade, aos betabloqueadores e aos ansiolíticos;
e, para os quadros de depressão, tão comuns em todos os tipos de demência, existem hoje muitas opções medicamentosas.
e, para os quadros de depressão, tão comuns em todos os tipos de demência, existem hoje muitas opções medicamentosas.
Como o grupo populacional de pessoas acima de 65 anos é o que mais cresce, as universidades serão obrigadas a alterar seus currículos para ensinar as novas gerações de médicos e paramédicos a lidar com o problema. Os serviços de saúde terão de ser reorganizados para atender à demanda dessa população de doentes, que não pára de aumentar. E, mais do que tudo, as famílias precisarão preparar-se antecipadamente para dar assistência aos mais velhos. Chegar ao fim da vida enclausurados num mundo estranho talvez seja o preço a pagar por insistirmos em viver mais tempo do que a evolução previu.
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