terça-feira, 14 de abril de 2015

“Nós não nos conhecemos, nós nos descobrimos”

Escrito por  Isabella Quadros(*)
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nos-nao-nos-conhecemos-nos-nos-descobrimos-fotodestaqueFrase do célebre psicólogo James Hillman dá título à reflexão sobre o quanto para Judi Dench, atriz, a dificuldade ou impossibilidade de ler roteiros seja impactante. Não quero negar os processos degenerativos ou influências genéticas que provocam limitações muitas vezes significativas durante o envelhecimento; contudo, gostaria de ir além nesta reflexão já que o pensar sobre nós mesmos não pode ser reduzido ao pensar sobre o nosso corpo. 
Domingo, dia de jornal recheado e me deparo com uma entrevista da atriz britânica a quem admiro muito pelo talento, Judi Dench (Revista Serafina, 29/03/15, Folha de S.Paulo). Um trecho do texto aparece em destaque despertando a minha atenção: “Não há nada de bom em envelhecer. Só o direito de se comportar mal”. Leio um pouco mais e fico sabendo que a atriz sofre de degeneração macular – “uma condição médica que resulta em perda de visão no centro do campo visual – e precisa que alguém leia os seus roteiros”. 
Imagino o quanto para uma atriz a dificuldade ou impossibilidade de ler roteiros seja impactante. Não quero negar os processos degenerativos ou influências genéticas que provocam limitações muitas vezes significativas durante o envelhecimento; contudo, gostaria de ir além nesta reflexão já que o pensar sobre nós mesmos não pode ser reduzido ao pensar sobre o nosso corpo.  
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A segunda frase do trecho me intrigou: “Não há nada de bom em envelhecer. Só o direito de se comportar mal”. Afinal, o que significa se comportar mal? Será que ser mais autêntica nas suas ações e pensamentos? Ou preocupar-se menos com as opiniões alheias? Não seria a velhice uma fase onde, desobrigados de grande maioria das tarefas que assumimos ao longo da vida, pudéssemos seguir a nossa curiosidade e finalmente prestar atenção para a significativa parcela de vida não vivida que deixamos em suspenso por falta de tempo ou oportunidade? 
Através da homogeneização do conceito de velhice, tão relacionado ao biológico e suas limitações, esquecemos que a capacidade de ter ideias e sentir prazer com isso é uma possibilidade real e muito relevante. Talvez o se comportar mal mencionado por Judy Dench possa também significar o se experimentar de outras formas, inéditas e não permitir que a vida na sua potência, seja substituída por rotinas despersonalizantes e repletas de horários regrados, tabelas ou injeções. 
E por falar nisso, vale lembrar também o que sempre nos foi inadequado e que insistimos em manter na nossa bagagem ainda tão pesada. Será que não dá para reformular esse conteúdo? Jogar fora o que não nos serve mais ou nunca serviu?   
Na meia idade uma verdade incide com força em nossas vidas: A consciência do que realizamos e nos tornamos até o momento e a certeza do que não nos tornaremos independentemente dos anseios e desejos. Sim, é um momento doloroso, de desilusões. Ao longo da vida experimentamos sucessivas máscaras e seguimos nesta tarefa que é a autodescoberta e o autodesenvolvimento. Mas eis que, na velhice, temos uma grande possibilidade de dispor delas com mais facilidade entrando em contato com quem realmente somos e para além do estado da beleza e da utilidade capitalistas. Que tal o ser mais importante que o ter? E proponho desde já uma troca: Encarar os fenômenos da velhice não como indicação de morte, de falta de horizonte, mas como uma iniciação para outros modos de vida!  
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Judy Dench resume tudo isso maravilhosamente no último parágrafo do texto: “Gosto de filmar com amigos porque posso ser boba na frente de quem me conhece muito bem, e isso é maravilhoso”. Poder a cada dia ser mais e mais quem somos é mesmo maravilhoso e isso, definitivamente é o oposto de comportar-se mal...  
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PRADO, Maeli. Aos 80, Judi Dench, a 'M' de 007, bola pegadinhas com a amiga Maggie Smith. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/serafina/2015/03/1608829-aos-80-judi-dench-a-m-de-007-bola-pegadinhas-com-a-amiga-maggie-smith.shtml. Revista Serafina, 29/03/15, Folha de S.Paulo 
(*)Isabella Quadros é psicóloga e mestre em Gerontologia pela PUC-SP. É sócia da Anagatu IDH em Programas de Pós Carreira e colaboradora do Portal do Envelhecimento. Email: isabellaquadros@hotmail.com
http://www.portaldoenvelhecimento.com/longevidade/item/3580-nos-nao-nos-conhecemos-nos-nos-descobrimos

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