“Com 86 anos, ainda estou
direitinha...”
Sou Ida, de tempos em que crianças nascidas no sítio, mesmo que meninas
e com dez anos de idade precisavam levar milho, montadas em um cavalo, para o
moinho, por quilômetros, para voltar com um pouco de fubá. A família plantava
para sobreviver, com um pai com fácil acesso aos alambiques e nenhum tratamento
para o alcoolismo. Sacos de adubo, farinha e açúcar transformavam-se em roupas. Faltava
alimento, com quinze anos meu apelido era “bacalhau”. Nos bailes nas tulhas, os
moços eram suados, cheirando a bebida. Não me interessavam. Na novena, um moço que era arrimo de família
chamou minha atenção. Começamos nossa vida de casados muito pobres. Surgiu
chance de emprego em Carioba, um patrão que nos dava trabalho, luz elétrica e
água “a rodo”. Era maravilhoso. Assim que nasceu o primeiro filho, resolvi
ficar em casa. Vieram mais duas crianças, os tempos mudaram, meu marido
tornou-se tecelão, e depois de anos de trabalho, já com hérnia de disco, ganhou
de presente de seu patrão, quatro teares que nos sustentaram, permitindo que eu
trabalhasse tendo os filhos próximos. Ele tornou-se um combativo vereador, nos
tempos de ser político tendo como paga a gratidão do povo. Faz vinte e sete
anos que ele se foi, continuo morando na mesma casa, por escolha minha, eu e
Deus. Participo intensamente da vida dos filhos, mas também da minha comunidade
– não consigo viver sem gente por perto. Vou à igreja, faço ginástica,
participo de grupo de idosos e de coral. Brinco com todos, o tempo todo. O
corpo já dá alguns poucos sinais dos anos vividos, mas isso não abala minha
alegria de viver. “Gosto de pessoas e amores inteiros. Porque não sei me dar
pela metade nem por partes. Eu transbordo. E se você também for do time que
transborda, vem pra cá.” -Clarissa
Corrêa.
Caso real,
Elizabeth Fritzsons da Silva, psicóloga, e-mail: bfritzsons@gmail.com
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