Por Manuela Dantas, especial para o Blog de Jamildo
Viver uma situação traumática não é fácil... A que vivi não foi diferente... Cheguei a pensar após a terceira cirurgia e uma infecção hospitalar séria, a qual quase me fez voltar a UTI (Unidade de Terapia Intensiva), que não conseguiria resistir muito tempo àquelas febres altíssimas e tremores, porém a única certeza absoluta que tinha era a vontade inabalável de continuar viva.
E continuei viva!
Pois é continuei viva e tive que aprender a viver com minha nova condição, já que estava paraplégica e precisava seguir em frente, e para isso algumas características me ajudaram a superar esse desafio e por essa razão resolvi compartilhar com vocês essa experiência com o intuito de colaborar com pessoas que estejam passando por situações semelhantes, ou que por ventura venham a passar.
A primeira característica que identifico que me ajudou nesse percurso foi meu otimismo intrínseco, na verdade me classifico como uma otimista racional, já que procuro avaliar as situações colocando em evidencia o lado bom, por pior que seja o fato, mas, claro, sem me esquecer de ponderar todas as dificuldades e o que fazer para superá-las.
Outro aspecto importante que colaborou para minha superação da crise é que sempre tive boa autoestima. Na ocasião do acidente estava bem resolvida profissionalmente, como também pessoalmente, o que não me fez rejeitar imediatamente as novas condições do meu corpo e sim a querer lutar para reverter à situação que me foi apresentada e continuo lutando...
No mais, o que me foi indispensável nessa caminhada foi o autocontrole, na verdade essa capacidade eu descobri que possuía no dia do acidente, já que eu era entre os acidentados a que estava mais fortemente machucada, e, no entanto mantive a calma suficiente para orientar o meu resgate no sertão do Ceará e assim o meu quadro bem grave (fratura na coluna cervical, fratura na coluna torácica com lesão medular, perfuração do pulmão, hemorragia interna, poli traumas nas costelas) não teve nenhuma complicação até conseguir chegar ao Hospital em Recife 12 horas após o acidente.
De fato, no momento do trauma eu não tinha a mínima ideia que essas características e capacidades me ajudariam a superar a crise e até mesmo a me manter viva, na verdade, as situações foram acontecendo, o tempo foi passando e eu fui vivendo um dia após o outro e cada dia foi um aprendizado diferente, mas o fato é que hoje sei que todas essas características que foram fundamentais para superar traumas, obstáculos e adversidades podem ser capacitadas e melhoradas durante a vida, principalmente as duas últimas, inclusive, acredito, que se o mesmo acidente que vivi tivesse acontecido 10 anos antes a minha resposta de superação não teria sido a mesma, ou com certeza eu necessitaria de um tempo maior de retorno a sociedade e a vida normal.
Ademais o que quero dizer é que a vida real e a exposição normal às dificuldades da vida nos treinam para as grandes adversidades que talvez tenhamos que enfrentar um dia, mas o que sei é que ter passado por dificuldades menores de forma esporádica manteve a saúde mental necessária para que eu enfrentasse um trauma profundo mais tarde sem depressão e sem angustia e mesmo, por opção, sem psicólogo e sem psiquiatra.
Na verdade, isso, que expliquei através de uma vivência real, nada mais é do que uma capacidade do cérebro, que vem sendo mais estudada nos últimos 5 anos, chamada Neuroplasticidade, que é a habilidade do cérebro se reconfigurar segundo os estímulos que recebe, ou seja, o cérebro é capaz de modificar seu funcionamento de acordo com os estímulos que recebe, o que explica o fato de dependendo de algumas situações externas, o cérebro poder ser estimulado a reagir ou a se entregar.
O fato é que o nosso cérebro pode muito mais do que conhecemos e temos como trabalhar as suas capacidades a nosso favor, de modo a facilitar as nossas demandas e enfrentarmos situações de estresse de modo mais eficaz.
Aliás, nessa busca pelo enfrentamento das adversidades, surgiu outra capacidade fundamental que também pode ser aprimorada com o tempo e a experiência, chamada resiliência, que pela definição científica é a capacidade de se adaptar às situações para superar as adversidades com menor nível possível de estresse.
Aprendi, também, sobre a resiliência com o tempo... Hoje sempre falo que o ser humano se adapta a tudo, a qualquer situação, mas certamente, há 10 anos não diria isso e não teria essa certeza que hoje tenho...
Paralelo a esse arcabouço de características e capacidades importantes para a superação e com a experiência, hoje concluo que diversos fatores colaboraram para minha rápida recuperação mental e dentre eles o mais importante sem dúvida foi o apoio da minha família e amigos, que me deram carinho, compreensão, alegria, força, amor e tempo.
Por fim, lanço mão das palavras de Nelson Mandela para concluir esse artigo: “Eu sou o capitão da minha alma.”. Também sou a capitã da minha alma, Nelson!
Postado por Mar
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