22/10/2013 - 03h05
Botox no cérebro
Escrevi para a Folha, em novembro de 2012, o texto "A bela velhice".
Um fato me chamou a atenção. Costumo receber muito mais mensagens de mulheres comentando os meus textos. No caso de "A bela velhice" só recebi e-mails de homens. O primeiro foi o seguinte:
"Cara Mirian, tenho 69 anos, acabei de me aposentar. Ler o seu texto me deu ânimo para buscar alternativas mais prazerosas para o futuro. Estava em busca de cursos de reciclagem. Sua crônica me induziu à reflexão: estou cheio de ser o que sempre fui profissionalmente. Mais do que isso: você me deu forças para buscar algo novo e que me dê prazer. Muito obrigado."
Os leitores enfatizaram o desejo de estudar e de trabalhar em algo que lhes dê prazer. Querem ser produtivos e ativos nessa fase da vida. Não querem apenas ocupar o tempo, passar o tempo, preencher o tempo, perder tempo. O tempo, para eles, é algo extremamente valioso e não pode ser desperdiçado.
Eles gostaram, particularmente, da ideia de ter um projeto de vida na velhice. Eles não precisam mais, mas querem continuar trabalhando em algo que dê sentido às suas vidas. Eles querem, mais do que tudo, encontrar um significado para a última fase de suas vidas.
Cheguei à conclusão de que o lema para uma "bela velhice" poderia ser: "eu não preciso (mais), mas eu quero". Eles querem ter tesão no que fazem, envelhecer do jeito que escolheram e não de acordo com as convenções sociais. Não querem se aposentar de si mesmos.
Em uma entrevista sobre a passagem do tempo e a velhice, a atriz Marieta Severo, de 66 anos, disse: "Vejo tanta gente preocupada em colocar botox na testa, eu queria poder colocar botox no cérebro. Tenho verdadeiro pavor de perder a capacidade mental, é isso o que mais me assusta quando penso na velhice. Quero ser uma atriz velha com capacidade de decorar um texto, quero ser lúcida na vida e na família".
A "bela velhice" não é um caminho apenas para celebridades. A beleza da velhice está exatamente na sua singularidade. E também nas pequenas e grandes escolhas que cada indivíduo faz, em cada fase da vida, ao buscar concretizar o seu projeto de vida e encontrar o significado de sua existência.
Mirian Goldenberg é antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autora de "Coroas: corpo, envelhecimento, casamento e infidelidade" (Ed. Record). Escreve às terças, a cada 15 dias na versão impressa de "Equilíbrio".
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