terça-feira, 8 de novembro de 2011

Família e escola juntas na inclusão

Tânia e Márcia, mãe e professora de Patrick, afirmam que os avanços na aprendizagem do garoto só serão conseguidos com a parceria entre elas, um verdadeiro trabalho de equipe

Débora Didonê

Até o ano passado, Márcia Pereira de Souza, professora da EMEIEF Ruth Rocha, em Ji- Paraná, a 380 quilômetros de Porto Velho, não acreditava na inclusão. "Se crianças com deficiência não aprendem como as demais, por que colocá-las em classes regulares?", pensava. Ela até as aceitava em sua sala, mas achava que apenas observar os "normais" bastaria para o aluno não se sentir excluído. Agora ela é apaixonada por educação inclusiva. Quem a fez mudar de idéia foi Tânia Regina Pessoa Martins, mãe de Patrick Nerys, 9 anos, que vibrava a cada nova palavra que o menino, que tem paralisia cerebral, aprendia a ler e a escrever e nunca duvidou do potencial do garoto. Hoje Patrick cursa a 2ª série. "O diálogo entre a família do aluno com deficiência e o professor é fundamental para o desenvolvimento da criança", explica Eliane Mauerberg de Castro, coordenadora do Programa de Educação Física Adaptada da Universidade Estadual Paulista, em Rio Claro, no interior de São Paulo. Márcia e Tânia contam, a seguir, como uma ajudou a outra no processo de aprendizagem de Patrick.

NOVA ESCOLA - Como foi a aproximação de vocês quando o Patrick entrou na escola?

Márcia - Quando Tânia me contou que o menino tinha paralisia cerebral, perguntei à direção por que ele havia sido matriculado na minha sala se não era capaz de aprender. Eu tinha 25 alunos para alfabetizar e muito medo de que o índice de reprovação da turma aumentasse. Com as conversas diárias com Tânia, sempre cheia de esperança, fui percebendo que o trabalho de inclusão poderia dar certo. Ela perguntava o que o filho havia aprendido e comemorava as pequenas conquistas dele. Isso me contagiou.
Tânia - Márcia era a terceira professora de Patrick, e com todas elas meu procedimento foi o mesmo: expliquei detalhadamente o que ele tem, deixei o laudo médico na escola para consulta e contei que ele pode fazer quase tudo na sala de aula. Márcia estava apreensiva, mas demonstrava interesse em ajudar.

NOVA ESCOLA - Como foram os primeiros dias de aula?

Márcia - Foram difíceis. Eu ficava incomodada por Patrick não ter o mesmo ritmo das outras crianças. Ele rolava no chão, derrubava objetos, batia na cabeça dos amigos e ainda ria quando eles choravam. Cheguei até a pedir que ele voltasse para a pré-escola... Meu erro foi querer que ele agisse como os outros. Quando fui me informar sobre inclusão, comecei a perceber as diferenças e, junto com Tânia, procurei uma psicopedagoga.
Tânia - Meu filho sempre foi maior que os colegas e machucava os outros com suas brincadeiras. Todos reclamavam muito. Eu o repreendia quando isso acontecia e dizia a
Márcia para fazer o mesmo. Inclusive levá-lo à diretoria se fosse preciso. Deixei claro que ele devia ser tratado como os demais.

NOVA ESCOLA - O trabalho didático feito na escola precisa ser reforçado em casa?

Márcia - Às vezes, sim, como na fase de alfabetização. Nesse período, ele faltou muito às aulas de reforço por causa do efeito dos remédios, que dão sono e cansaço. Montei então uma estratégia para ele estudar em casa e Tânia topou ajudar. Perguntei o nome das pessoas e dos bichos de que ele gostava e escrevi cada um numa folha de papel, com as iniciais em letras maiúsculas. Tânia colou as folhas no quarto do filho e lia com ele todos os dias. Um dia ele chegou feliz da vida porque descobriu que macaco começa com a mesma letra do meu nome. Sugeri também a Tânia que, quando fossem ao supermercado, ela mostrasse os produtos e lesse os rótulos para ele.
Tânia - Estou sempre por perto para orientar no que for necessário. Gosto de observá-lo e contar à professora como ele reagiu em cada atividade.

NOVA ESCOLA - Quais informações sobre o aluno são importantes para a escola?
Márcia - Todas as informações são fundamentais. Um dia, um dos meus alunos teve problemas para respirar e eu não sabia como acalmá-lo. Teria sido diferente se a mãe tivesse me avisado do distúrbio. Os pais podem nos ajudar a entender por que o filho falta. Certa vez fiquei doente e tirei duas semanas de licença. Patrick não queria mais vir à escola. Tânia comentou comigo que ele adorava jogos de quadra. Quando voltei, organizei uma partida de futebol de rodo - no qual o utensílio é usado para empurrar um objeto para dentro do "gol", embaixo de uma cadeira -, mandei um convite e ele voltou a estudar bem animado.
Tânia - Preocupo-me em descrever seu estado de saúde e peço à professora para dar os remédios no horário. Acho interessante também contar sobre o desempenho dele nas tarefas de casa. Se percebo que está mal-humorado ou irritado antes de ir para a escola,
digo a ele para se controlar e se comportar bem na classe. Sempre deixo claro que a professora é a autoridade.

NOVA ESCOLA - Quais foram os avanços de Patrick desde que entrou na classe regular?

Márcia - Ele já sabe ler e escrever muita coisa e conseguiu isso junto com os outros alunos. Fiquei tão contente com os avanços dele que comecei a mostrar seus trabalhos para todos, na escola e na universidade.
Tânia - Eu não imaginava que ele pudesse interagir tanto. E como gosta de aprender! Dia desses fui buscá-lo na escola e ele estava concentrado fazendo contas de Matemática. Foi uma surpresa! Sua atitude também mudou: agora ele age com bastante autonomia, quer ir sozinho para a escola e diz que não é mais bebê para ser acompanhado até a porta da sala.

NOVA ESCOLA - Que outras conquistas vocês conseguiram com ele?

Márcia - Batalhamos juntas por uma sala de recursos. Ficamos sabendo que havia uma sala equipada e trancada em outra unidade. Liguei várias vezes para a Secretaria de
Educação pedindo a transferência do material e, como a resposta demorou, resolvi ir com
Tânia até lá. A coordenadora de ensino se sensibilizou, entrou em contato com nosso diretor e em um mês a sala foi montada. Cerca de 50 crianças, da Ruth Rocha e de outras escolas da vizinhança, passam pela nova sala todas as semanas.
Tânia - Márcia fez curso para trabalhar com inclusão e ficou sabendo que um tratamento com psiquiatra poderia ajudar no caso de paralisia cerebral. Ela sugeriu, eu topei, e fomos juntas à primeira consulta. Márcia contou ao médico como meu filho se comportava na sala de aula. Patrick melhorou 90% em menos de um ano. Fiquei admirada porque, até então, eu nunca tinha sido aconselhada a fazer esse tipo de tratamento com meu filho.

Quer saber mais?
EMEIEF Ruth Rocha, R. São Luís, 1831, 78960-000, Ji-Paraná, RO, tel. (69) 3424-4623


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